Em 1986 visitei pela primeira vez o distrito de São Pedro de Itabapoana, no município de Mimoso do Sul, no Espírito Santo. Fui levado pelo meu amigo Pedro Antônio de Souza, que era, na época, secretário municipal de Saúde. Foi uma despretensiosa visita a uma vila praticamente morta. Eram casas antigas – quase todas construídas na segunda metade do século XIX – e em péssimo estado de conservação. Guardo na memória dessa primeira viagem, desse primeiro olhar, apenas as cenas daquele casario abandonado. Daquelas ruas sem gente. Era bem triste. Não me lembro se Pedro falou de seus projetos, de seus sonhos.
Em 2015, portanto quase 30 anos depois, voltei a São Pedro, mais uma vez na companhia de Pedro Antônio. O secretário agora era eu. Dirigia a Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo e estava oficialmente conhecendo aquele sítio histórico. Entre a primeira e a segunda visita muita coisa havia mudado. Para melhor. Em 1987 o distrito havia sido tombado pelo Conselho Estadual de Cultura, por seu patrimônio arquitetônico. O tombamento, fiquei sabendo, tinha sido resultado de uma extensa articulação de atores sociais, conduzida justamente por aquele amigo abnegado. Um médico que resolveu curar uma cidade.
A gestão do sítio histórico, ou seja, as medidas para a preservação daquele extraordinário patrimônio, estava momentaneamente sob minha responsabilidade. Outrora município grande produtor de café, com a segunda maior população do Espírito Santo, e uma extensão territorial que incluía vários de seus municípios vizinhos. O legado histórico é evidente. Políticas públicas devem ter sempre em foco essa preservação, mecanismos devem ser encontrados para que aquela riqueza cultural não se perca.
O que explica um casario tão rico, um desenho urbano tão preservado foi o fato de o antigo município ter perdido sua dinâmica central no tempo do café, quando a ferrovia sul do Espírito Santo ficou pronta, e a estação ficou localizada – em 1896 – no então distrito de Mimoso. Progressivamente esvaziada nas primeiras décadas do século passado, São Pedro perdeu em 1930 a condição de sede do município, em um golpe apoiado pelas forças capixabas vitoriosas com Vargas.
Desse passado muitas coisas restaram e estão sendo preservadas, outras se perderam. Mas todos devem conhecer aquele sítio tão especial. O que temos como turistas capixabas para desfrutar é o clima ameno, a natureza exuberante, uma população gentil e acolhedora, vários eventos durante todo o ano e, sobretudo, a arquitetura do distrito sede e de pelo menos uma dezena de fazendas do café do fim do XIX. Não é pouco. Posso lhes garantir.
João Gualberto é doutor em sociologia, professor emérito da Ufes, ex-secretário de cultura e diretor da Saber Capixaba.
Fotografias de Thiago Ferreira