Alguns apontamentos sobre A condição urbana

Eliane Lordello

Romance de formação, o livro de Filipe Ferreira Ghidetti narra a condição urbana da juventude do personagem X, na Grande Vitória. Embora não nomeado, X tem um lugar de fala claramente demarcado: é um rapaz moreno, heterossexual, morador de bairro periférico de Vila Velha, estudante de graduação da UFES.

Não obstante a delimitação do lugar de fala, X poderia ser qualquer outro rapaz, nesse lugar de fala – é o que parece sugerir o autor, ao não nomear o personagem. Age, o autor, como o diretor americano AJ Schnack, em seu documentário sobre Kurt Cobain, intitulado About a Son (2006).

No filme, cada depoimento de Kurt é ilustrado por diversos rapazes diferentes, sugerindo que o roqueiro grunge viveu situações que poderiam ter sido vividas por qualquer filho de Deus. Assim também, o que X passa pode ser vivido por qualquer rapaz de sua condição urbana.

Ao longo de todo o livro, X está em perpétuo movimento pela Grande Vitória, e, de forma mais recorrente, dentro de um ônibus do sistema interurbano Transcol, em trânsito entre seu bairro e a UFES. Suas viagens são farto material de observações urbanas, verdadeiras “derivas”, para usar um termo caro aos urbanistas seguidores da Internacional Situacionista.

Movimento político e artístico difundido nos anos 1950-1960, tendo por expoente mais conhecido o marxista francês Guy Debord, autor do emblemático A sociedade do espetáculo (1967), o situacionismo se faz presente nas derivas de X.

Não é o caso de afirmar que Filipe Ferreira Ghidetti seja um situacionista assumido, ou tampouco que conheça o movimento. Mas suas narrativas urbanas do cotidiano de X são verdadeiras derivas situacionistas, e dão ao espaço urbano um inapelável protagonismo.

Livro de autor jovem, A condição urbana, se ainda não traz o deleite de um texto escorreito, vale pela trajetória realista e franca de X, e a significativa apreensão urbana da Grande Vitória.

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Esta é uma publicação de cooperação entre o site Tertúlia e o clube de leitura Leia Capixabas.

Editor responsável: Anaximandro Amorim