Ainda a tradução (3)

Geir Campos

Em artigos anteriores eu escrevi, aqui em A ORDEM, sobre tradução: da tradução como ocupação que não requer “presença” do trabalhador junto à empresa para a qual trabalha e, que, por isso, poderia ser exercida por alguns calçadenses de boa vontade e de boa formação... Falei, em meus artigos anteriores, de como eu próprio vivi uns tempos complementando meu orçamento doméstico com o que eu ganhava na qualidade de tradutor. Contei, também, que eu próprio nunca vivi exclusivamente disso: sempre tive a tradução como um “bico”, um complemento financeiro, por assim dizer... Mas tenho amigos, no Rio de Janeiro e em São Paulo, que não fazem outra coisa senão traduzir. Traduzem o dia inteiro: traduzir é o “trabalho” deles, sentam-se à mesa depois do café da manhã e só se levantam no fim do expediente, isto é, no fim de cada dia. E é sempre um dia de muito trabalho, com uma porção de dicionários e enciclopédias e outras obras de “referência” ao alcance da mão – pois um tradutor não há de nascer sabendo tudo, e uma porção de informações o tradutor há de buscar nesses livros especializados, etc. Tenho amigos que vivem de traduzir, e alguns que vivem de verter: alguns trazem para o nosso idioma textos escritos originalmente em outra língua, e outros passam para idiomas estrangeiros alguns textos originalmente escritos em português. São dois trabalhos mais ou menos diferentes, tradução e versão; a versão costuma ser melhor remunerada que a tradução. Mas valem, para a versão, as mesmas recomendações de fiz aqui com referência à tradução. Mutatis mutandis, é claro...

Devo dizer que sou Mestre em Comunicação, com uma “dissertação”, como dizem, sobre Tradução e ruído na comunicação teatral, publicada pela Editora Álamo, de São Paulo, em 1982 (mandei um exemplar para a Biblioteca Pública de Calçado). E depois me fiz Doutor em Comunicação com uma “tese” sobre O ato criador na comunicação interlingual, em vias de ser editada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Publiquei pela Editora Brasiliense um pequeno manual, na Coleção “Primeiros Passos”, sobre O que é tradução; e publiquei pela Editora Vozes um outro manualzinho, que complementa de algum modo os ensinamentos do primeiro, intitulado Como fazer tradução (1986). São livrinhos pequenos e baratos, mas também creio que deixei um exemplar de cada um em nossa Biblioteca Pública.

Mas estou aqui pensando se não valeria mais a pena, e se não seria mais produtivo, um curso de verdade – que eu mesmo daria aí em Calçado. Um curso em cinco aulas, bem “socadinho”, como se diz; mas já seria “uma lança em África”, como diriam os colonizadores lusitanos...

Eu mesmo já ministrei esse “curso” denominado “tradução para principiantes” em cinco aulas – que bem podem ser dadas nos cinco dias úteis de uma mesma semana – aqui no Rio de Janeiro, num auditório da Fundação Getúlio Vargas, e em algumas Universidades brasileiras – onde eu achava que ele poderia ter alguma utilidade. E cá estou eu a dizer bobagens: eu sempre “acho” que algum ensino de tradução tem “alguma utilidade”, e não é por outra razão que estou aqui a propô-lo aos calçadenses. Vamos então combinar: o jornal A ORDEM e seus leitores calçadenses combinam aí na pensão um alojamento para mim e para minha companheira, durante uma semana, e durante essa semana eu me comprometo a dar as cinco aulas do curso de tradução para principiantes, cujo programa posso desde já adiantar: 1) Tradução, definições e conceitos, tipos e níveis, bilinguismo e contato de línguas; 2) Normas gerais de tradução; análise preliminar do texto a traduzir; as unidades de tradução; 3) Tradução literal; suas possibilidades e limitações; correspondência formal e equivalência textual; 4) Tradução oblíqua e seus procedimentos; adaptação; 5) Limites da traduzibilidade; qualidade e defeitos de uma tradução.

Aí está o programa – o programa que eu tracei, evidentemente – para um curso de tradução para principiantes. Imagino que, ao cabo de um curso assim, eventuais interessados na profissão tradutória já terão pelo menos uma ideia mais firme do trabalho a que estarão aspirando. E creio mesmo que, com as boas professores de português que os calçadenses têm, aí em nossos Colégios de Calçado, o ofício de tradutor não há de ser nenhum “bicho de sete cabeças”, como se diz...

Combinando, de novo: vocês, de Calçado, conseguem para um casal a reserva de acomodações (um quarto com banheiro) por uma semana durante o mês de julho – que é meu mês de férias na Escola de Comunicação da UFRJ, onde sou professor, e eu vou, durante essa semana combinada, dar aí em Calçado as cinco aulas programadas, numa sala de aula que vocês também se incumbirão de conseguir. Feito? É isso aí. Comprometo-me a nada cobrar pelas aulas; vai ser para mim um renovado prazer estar de novo entre meus concidadãos e desta vez com um propósito útil à comunidade. Até lá!

Sugiro que quaisquer “entendimentos” complementares sejam levados a efeito por intermédio do meu bom amigo Antônio Borges de Rezende, diretor do jornal A ORDEM, para os chamados “devidos fins”.

É interessante, mas não indispensável, que os eventuais candidatos a alunos do referido curso de “tradução para principiantes” tenham algum conhecimento de inglês e/ou de francês. Eu tenho vários textos bilingues, nesses dois idiomas...

Publicado originalmente no jornal A ORDEM, ano LXII, São José do Calçado, domingo, 12 de fevereiro de 1989, nº 2494.

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Esta é uma publicação de cooperação entre o site Tertúlia e a Academia Calçadense de Letras.