Tardes amarelas

Falávamos daqueles pré-históricos jogos de futebol no Estádio Governador Bley. Xerxes, um aficionado, como eu, na época. Não perdíamos um jogo, aos domingos. Então Xerxes, falando desse tempo, disse a frase: “Lembra? Eram tardes amarelas”. Exatamente. Dessas frases-síntese que resumem a multidão difusa de personagens e cenários como essa do Marien Calixte que fala de nossa cidade. “Tardes amarelas” nos remetem a uma dessas idades de ouro que certamente nunca existiram, mas que, no caso, se traduziam em dias de sol fazendo estalar a grama verde do campo de futebol, os morros sempre coloridos que circundam o Estádio onde nossos times eram sempre vencedores, os atletas excepcionalmente bons, os torcedores grupos de pessoas educadíssimas e solidárias, etc. e que, na verdade, no fundo, expressam uma saudade dos verdes anos. Tempos que conseguiam se materializar numa utopia, por assim dizer, na frase feliz do poeta Xerxes Gusmão Neto.  

Essa uma das inumeráveis e gostosas conversas de nossos intermináveis almoços das quartas-feiras, numa fase em que Xerxes voltava para Vitória depois de exercer importantes cargos executivos no Rio de Janeiro em jornais e rede de televisão. Almoços como uma festa.

Esses almoços das quartas-feiras, para alguns, faziam parte de uma prévia para as reuniões do Instituto Histórico onde Miguel Tallon era presidente. Os almoços começavam ao meio-dia e as reuniões do Instituto às dezesseis horas. Nesse tempo Xerxes passou a ser membro do Instituto, onde publicou o seu livro de poesias “Sangue no Muro”, que fez parte da “Dezembrada de 1997”, nome cunhado por Reinaldo Santos Neves para celebrar o tradicional lançamento de livros que o IHGES faz nos finais de ano. Xerxes se emocionava quando se lembrava da grande festa que marcou o lançamento de uma trintena de autores (inclusive ele) na Cantina do Julinho, na Mata da Praia, sob a batuta do Miguel. Quando fiz uma pequena resenha daquela festa e a publiquei na revista ESSA, vi os olhos do Xerxes brilhando de saudade. Uma saudade que agora todos temos dele.

Fica difícil falar disso tudo sem cair nas banalidades do que há de patético na existência humana. Talvez, no caso, como o de tantos amigos que ultimamente nos têm antecedido na “grande aventura”, dizer que exatamente o registro é feito porque suas vidas não foram banais.

 

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