Para ler

Morte em V., por Reinaldo Santos Neves

Ruy Perini

O título é uma clara alusão a Morte em Veneza, publicada em 1912, segundo livro de sucesso de Thomas Mann.

Porém o livro traz como subtítulo “CONTENDO VIDA E OPINIÕES DE UM CERTO RAINER MARIA RAINER, ESCRITOR”, referência a The Life and Opinions of TRISTRAM SHANDY Gentleman, a obra-prima de Laurence Sterne, que no século XVIII revolucionou a forma do romance. Mas também um explícito encômio a Rainer Maria Rilke, ao tratar de um suposto autor biografado por uma narradora onisciente, mas não identificada, autor que teria ganhado o nome numa homenagem do pai ao poeta e romancista austríaco. Leia

 

Alvorecer de poemas

Marcos Tavares

Depois de, em 2022, ter publicado A noiva de Paris, um romance psicológico e sociológico que muito traz de escrita marcel(a)-proustiana, para manter-se sempre lembrada no circuito literário não mais precisaria anunciar  um outro título a ficcionista Marcela G. Neves. Escritora inquieta tal como o é na leitura desde tenra idade, doravante ela expõe a público um feixe de poemas. Ao volume não à toa o intitula Poemas de arrebol. Leia

 

Meu encontro com Geir Campos

Pedro J. Nunes

Não posso dizer com todas as letras que Geir Campos tenha sido uma influência decisiva para que eu me tornasse escritor. Mais prático acreditar que eu fosse afetado pelos meridianos traçados sobre minha eternamente mítica São José do Calçado, uma cidade com vocação literária endêmica, e pelo efeito dos brotos literários que a leitura, essa, sim, minha primordial e verdadeira vocação, fizesse surgir no caule áspero e bruto de minha inconsciência. O mais daquilo que compõe um escritor nem ele nem a eternidade podem dar conta de desvendar. Leia

 

Às margens do rio escuro

Luiz Guilherme Santos Neves

Refinado. Literariamente refinado é o romance Às margens do rio escuro, de Getúlio Marcos Pereira Neves.

E o refinamento não está apenas na versatilidade da  linguagem de alto nível em que o texto flui, rio escuro abaixo, da primeira linha até a última. Está, sobretudo, na estruturação que o autor conferiu ao romance: basicamente três trilhos de desenvolvimento estrutural – folclore, História e ficção – sobre os quais a narrativa corre num manejo magistral em que cada trilho completa o outro e em que a falta de um ou de outro eliminaria a existência do romance. Leia

 

Livros que se ouvem

Pedro J. Nunes

Não sei quando em um dado momento da história da edição de livros os editores descobriram o filão de publicações destinadas aos ouvintes mais exigentes de todos os gêneros musicais. Esses guias são assinados por autores os mais diversos. Pincei dois exemplos para ilustrar esta afirmação: o Guia ilustrado Zahar de música clássica, editado por John Burrows, um guia respeitado, e um pretensioso Discoteca básica: 100 personalidades e seus 10 discos favoritos, em que Zé Antônio Algodoal permite que personalidades as mais diversas indiquem, pelas minhas contas, nada mais do que 1.000 discos essenciais. Leia

 

Vida e morte à sombra do Jaspe

Maria das Dores Teixeira de Rezende Raggi

A coletânea Vida e Morte à Sombra do Jaspe constitui-se de contos com múltiplas temáticas. Os diferentes matizes textuais propiciam a inusitada imbricação entre fatos reais e fictícios, entre a vida e a morte. O realismo fantástico domina grande parte das histórias. Porém, algumas delas trazem doces lembranças da infância e da adolescência do autor, refletindo, de um lado, a singela alegria, e, de outro, a grande e perturbadora melancolia. Uma vasta gama de influências literárias, ilustrada pelas epígrafes de grandes escritores, nacionais e internacionais, traduzem o gosto requintado pela leitura. Leia

 

Sobre a incerteza da sobrevivência de obras literárias

Bernadette Lyra

Nestes tempos confusos, um tsunami de obras literárias inunda o país. Tornou-se difícil pensar, com clareza, as chances de qualquer escriba sobreviver na memória da minúscula massa de gente que lê. Há quem diga que sobreviverão apenas os mais criativos, mais talentosos, mais bem qualificados para a nobre tarefa da escrita.  Isso não é coisa certa. Em matéria de literatura, a sobrevivência é uma inconstante. Por vezes farfalha, lançada aos ventos da moda; por vezes falha, mergulhada no esquecimento. Leia

 

José Carlos Oliveira, a atualidade da crônica

Getúlio Marcos Pereira Neves

A crônica exerce sobre o leitor uma atração natural, talvez pelo talhe esguio da forma e o calor envolvente do conteúdo. Sua ligeireza convida à leitura, e época houve em que os jornais lançavam mão dos cronistas para fidelizar público. Lembra-me aqui um deles, dos bons e argutos que passaram pela imprensa carioca (o que vale dizer, brasileira), numa altura em que a vertiginosidade dos acontecimentos começava a se pôr e a irreverência se revelava uma das vias possíveis para a tradução daquilo tudo ao leitor. Leia

 

A alegria e a emoção da atividade de ler

Bernadette Lyra

Contrapor a quantidade de gente que anda por aí escrevendo literatura de ficção ou poemas ao número infimamente ridículo de pessoas que leem, em nosso país, pode parecer coisa de quem não tem assunto mais importante a tratar. Pois eu digo que isso depende do que seja um assunto importante. Para mim, por exemplo, leitura literária é coisa importantíssima. Não apenas por ser proveitosa e ajudar na formação do pensamento crítico, mas também porque é ferramenta das mais poderosas quando se trata de alicerçar práticas que nos permitam transitar pelos labirintos intrincados da vida. Leia

 

O Espírito Santo não respeita seus escritores

Francisco Aurélio Ribeiro

Não foi à toa que Saul de Navarro, Mendes Fradique, Rubem Braga, Danuza Leão, Carlinhos Oliveira, Viviane Mosé e Elisa Lucinda, dentre muitos outros, deram tchau e bênção para o nosso estado e não voltaram, a não ser para visitar, às vezes. Não vale a pena ser escritor capixaba, publicar livros aqui e não ser reconhecido. E o único reconhecimento que um autor deseja é ser lido. Há alguns escritores que fazem até pequenas tiragens, cinquenta ou cem exemplares, para distribuir aos amigos, certos de que, pelo menos por eles, serão lidos. Às vezes, nem isso acontece. Bernadette, com dois tês, gente, já escreveu sobre isso, aqui: há mais gente escrevendo do que lendo. Meu reino por uma resenha, afirmam outros. E não adianta criarem “Dia do Escritor Capixaba”, “Medalha ou Comenda Rubem Braga” e outros que tais, tudo isso  é vaidade, pura vaidade. Homenagens não pagam boletos, não é, Mara Coradello? Leia

 

Salmos da montanha

Fábio Daflon

Com que salmos, suratas, analectos ou bagavadeguitás se pode expressar o saber a fé? Em que boa companhia a fé pode estar? Num dos versículos mais belos do Alcorão está escrito: “Se os oceanos fossem feitos de tintas, elas seriam insuficientes para descrever a fé do Islã.” Imaginem então a dificuldade atinente a resenhar o livro Salmos da montanha, de Matusalém Dias de Moura, que, essencialmente, e com que essência, é um livro sobre profissão de fé. Leia

 

Um livro sobre a discografia da música produzida no Espírito Santo

Contar a trajetória da música popular no Espírito Santo por meio de sua produção fonográfica: este é o tema do novo livro do jornalista e escritor José Roberto Santos Neves, Os sons da memória – uma leitura crítica de 40 discos que marcaram época na música do Espírito Santo, selecionado pelo Edital de Produção e Difusão Literária 018/2019 da Secretaria de Estado da Cultura.

Sexto livro de José Roberto Santos Neves, Os sons da memória é resultado de uma extensa pesquisa desenvolvida pelo autor sobre a música popular produzida no Estado, com foco em seus principais personagens. Leia

 

Transpaixão: a linguagem do mistério

Ítalo Samuel Wyatt

A literatura não nasceu por obra da genialidade de algum notável ancestral ou grupo étnico que percebeu a potência dos sistemas de escritas a serviço da fantasia e do cotidiano. Na verdade, o surgimento da literatura é laudatório, subserviente, ápice de um soslaio, já que a sua origem remonta à necessidade de garantir robustez e a persistência das crenças, mitos e religiões antigas. Leia

 

A Revista da Academia Espírito-santense de Letras

Francisco Aurelio Ribeiro

A Academia Espírito-santense de Letras foi criada em 04 de setembro de 1921 e, diferente do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, cuja fundação ocorreu cinco anos antes, seus primeiros membros não pensaram ou viabilizaram uma revista para a publicação dos trabalhos e criações literárias de seus sócios. Assim, muito se perdeu da escrita produzida pelos primeiros ocupantes de suas cadeiras, infelizmente. Apenas setenta anos depois, em 1991, saiu uma revista especial da AEL, comemorativa do seu septuagésimo aniversário, na gestão do Dr. José Moysés e tendo como editor Marien Calixte. Leia

 

O fim da nau

Erlon José Paschoal

Todos conhecem a destreza narrativa de Luiz Guilherme Santos Neves - escritor e historiador com vários livros publicados -, sobretudo através de sua obra O capitão do fim, narrada na primeira pessoa pelo primeiro donatário da Capitania do Espírito Santo, o próprio Vasco Fernandes Coutinho, após a sua morte - relatos póstumos como se fosse um Brás Cubas capixaba -, que flui levemente com sua  estrutura épica ágil e, ao mesmo tempo, distanciada e elucidativa. Leia

 

A névoa, o menino e o embornal

Fábio Daflon

Lançado em 2020, no, literariamente, profícuo ano da literatura capixaba, o livro A névoa, o menino e o embornal, de Matusalém Dias de Moura, se nos afigura quase como um perfil do autor. Mas o perfil, se nos reportarmos à Idade Média, era como se pintavam os retratos naquele tempo. Na orelha do livro, o retrato do autor está em oblíquo, a orelha esquerda dele aparece e a direita mostra apenas pequeno pedaço do pavilhão auditivo. O mais é o olhar cativante e o sorriso largo sob o nariz anasalado que desconhece a empáfia. Hilda Hilst, citada de memória, certa vez disse que o leitor não deve conhecer o autor para não se desapontar. Além de conhecer o procurador da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, sabia-o, até então, principalmente poeta de variados estilos, autor de haicais singelos, quadras e trovas e sonetos, nunca lera antes nenhum dos seus livros de prosa, sei agora que já publicou cerca de trinta títulos. Leia

 

Os signos no discurso poético de Jorge Elias

Ester Abreu Vieira de Oliveira

Neste período de pandemia ocasionada pela covid-19, o correio me trouxe Sonetos em crise, de Jorge Elias Neto, médico cardiologista que pertence à Academia Espírito-santense de Letras, Cadeira 2, cujo patrono é Graciano dos Santos Neves, que, também, foi médico. O lançamento é original e humanitário, pois a arrecadação servirá para alimentar pessoas sacrificadas pelo Corona vírus, o que mostra a sensibilidade do poeta.

Como em outras produções poéticas de sua autoria, Jorge Elias Neto ratifica com essa obra seu domínio na arte de jogar com os signos do discurso e do sistema da língua. Leia

 

Um belo poemário

Matusalém Dias de Moura

Homem de letras festejado por todos que o leem, tanto na prosa quanto na poesia, Getúlio Marcos Pereira Neves brinda-nos agora, neste Poemário mirim de pertinências várias, com um punhado de poemas curtos, numerados, de versos também curtos, à moda do modernista Oswald de Andrade, em sua poesia minimalista, e do saudoso poeta e conterrâneo nosso Miguel Depes Tallon, em seus poemetos primeiramente publicados em cartões, distribuídos gratuitamente de mão em mão aos amigos mais chegados, e depois, somente depois, enfeixados em livros para conhecimento e deleite de seus muitos leitores. Leia

 

Professor Amâncio Pereira, um esquecido

Francisco Aurelio Ribeiro

Todo mundo sabe que a memória capixaba de seu passado, de sua história e de seus personagens históricos é uma vaga lembrança. Dentre essas figuras esquecidas, hoje, está a do professor Amâncio Pinto Pereira, nascido em Vitória, em 1862 e aqui falecido, em 1918. Diferente de seu filho, o também professor e advogado Heráclito Amâncio Pereira (1894-1957), um dos fundadores da Faculdade de Direito, núcleo formador da futura Universidade do Espírito Santo (1954), federalizada em 1961, que teve o centenário de seu nascimento lembrado e comemorado, passou batido entre nós o centenário de morte do Professor Amâncio Pereira, ocorrido em 2018. Leia

 

Sonetos em crise

Krishnamurti Góes dos Anjos

Reza a lenda que as primeiras produções poéticas em forma de soneto teriam ocorrido lá pelo século XII, portanto no tempo que entendemos hoje como Idade Média, e que Dante Alighieri teria sido o primeiro grande poeta a compor sonetos. Definido como poema de quatorze versos, o soneto tem admitido bem pouca variação ou experimentação formal. Conservam-se seus dois modelos tradicionais: o italiano (fixado por Petrarca) e o inglês (fixado por Shakespeare), sendo o primeiro dividido em dois quartetos mais dois tercetos e o segundo formado por três quartetos mais um dístico de versos normalmente metrificados e rimados. Entretanto, e com o passar do tempo ocorreram experimentalismos como o do verso branco (sem rima), que acontece na poesia moderna. Leia

 

As montanhas da Lua, de Samuel Duarte: espaço, tempo e memória nos caminhos de Ariel

Ester Abreu Vieira de Oliveira

Samuel Duarte, nos 60 capítulos, distribuídos em dois volumes, de As montanhas da Lua (Cachoeiro de Itapemirim: Gracal Gráfica Editora, 1982), engendra a personagem Ariel, idealista, imaginativo, íntegro, corajoso, grande leitor, que procura descobrir um enigma de sua existência. Nessa busca esse ser vai captar a sua história ancestral ao mesmo tempo em que amplia, mediante o enigma do tempo, a história da humanidade, do Brasil e, principalmente, do sul do Estado do Espírito Santo. Contudo, sua inquietação não se limita à questão do tempo proustiano da busca pessoal, na memória pessoal, ao contrário, ele amplia o horizonte para o enigma do tempo coletivo, do tempo que gira para olhar o passado, para captar o mistério de sua própria história. Leia

 

Wilson Coêlho: um diabo no paraíso

Gilbert Chaudanne

Nesse livro, NOSOTROS, Wilson Coêlho representa ou apresenta uma face diferente de tudo o que escreveu até agora. Seus livros tinham um caráter dionisíaco. Aqui é um pouco diferente, se trata de uma espécie de testemunha de sua viagem à Cuba; ele não é o que sai da boca de Wilson Coêlho (Deixem-me Falar), mas o próprio país (Cuba) e o autor faz um trabalho de pesquisador. Ele olha a realidade de Cuba sem preconceito contra ou a favor. Wilson Coêlho se deixou levar pelo coração quando ele vê a condição das crianças. Dá a impressão de que temos um país que sobrevive apesar do “blocus continental” orquestrado pelo “Tio Sam” (desde que os USA boicotaram a Ilha) e Wilson Coêlho nos mostra que Cuba não é um país de delírio como a Coreia do Norte. Também não corteja os países dito ricos, e tem um vizinho que manda e desmanda no mundo. Leia

 

Prefácio

Tavares Bastos

Em pleno Renascimento, no limiar deste mesmo século, onde eram, aqui e ali, erguidas as últimas catedrais góticas no norte da França, com suas torres pontudas, em um outro hemisfério, até então habitado por tribos selvagens aparentadas com os povos mais longínquos do período para-asiático, os atos mais simples, os gestos mais normais de alguns europeus ali chegados tornar-se-iam de um significado insuspeito para a História daquelas terras distantes. (Tradução Anaximandro Amorim) Leia

 

Publicações capixabas coletivas

Pedro J. Nunes

As antologias entraram na história das publicações capixabas há 162 anos quando, no Ano da Graça de 1856, José Marcelino Pereira de Vasconcelos organizou a primeira coletânea reunindo escritores capixabas, o Jardim poético ou coleção de poesias antigas e modernas, compostas por naturais da província do Espírito Santo. Quatro anos depois, em 1860, viria a público o segundo volume. José Marcelino demonstrava conhecer o valor do que estava fazendo, consciente do futuro que sobreviria à sua antologia, mas revelava dificuldades na sua organização, quando, no prólogo, escrevia: “Um serviço importante presto nesta publicação à minha província; mas só o reconhecerão, depois que decorrerem séculos”. De fato, sendo a primeira, e numa terra cheia de dificuldades para a edição de um livro, não é difícil prever as dificuldades que ele enfrentou. Mas é inegável que, graças a seu esforço, preservou-se até nossos dias a memória de vários intelectuais e escritores que, de outra forma, teriam sido consumidos pela fumaça impiedosa do esquecimento. Leia

 

A biblioteca sobre o mar

Rogério Coimbra

“Minha presença aqui é afetiva e não acadêmica. Nunca frequentei academias, somente aquelas nas quais meus sinceros amigos eram infiltrados. No gênero, gostava mesmo de frequentar bibliotecas, e alguns arquivos, na infância e juventude. Sempre fui um curioso, e não pesquisador ou estudioso. Não sou escritor, mas sempre usei a máquina de escrever para produzir muitas laudas de críticas e crônicas sobre música na imprensa local. Leia

 

O neobarroco em Aninhanha

Josina Nunes Drumond

Neste trabalho, pretendemos percorrer algumas trilhas neobarrocas da obra Aninhanha, de Pedro José Nunes. Seguiremos traços conceituais, atentos à imponência do caminho e às flores que o bordejam: trata-se de figuras de estilo e de recursos estilísticos que embelezam a composição do ramalhete. Restringimo-nos à colheita das flores que enfeitam barrocamente as inúmeras sendas que se dispõem diante de nós. Tropeçamos em hibridismos linguísticos, escorregamos em distorções sintáticas, mas percorremos prazerosamente as trilhas que conduzem ao objetivo proposto. Devido à polissemia da obra, deparamos com inúmeras possibilidades de atalhos, nos quais corremos o risco de nos perder antes de retomar o caminho principal. Às vezes ficamos desnorteados diante de uma escritura labiríntica, fragmentária e hermética. Escolhemos apenas algumas “trilhas mais batidas”, ou seja, mais recorrentes e/ou relevantes, segundo nossa leitura, que, como toda leitura, é incompleta e lacunar. Leia

 

Contos de um capixaba espelhados na arte narrativa de Rubén Dario e Jorge Luiz Borges

Ester Abreu Vieira de Oliveira

Há, em uma obra de arte, uma integração com as outras obras do universo literário. O estado de legibilidade está no agrupamento da repetição, o que Julia Kristeva denomina “intertextualidade”. E, como é dentro de um sistema que se pode compreender melhor uma criação, juntamos aqui um terceto de escritores latino-americanos no gênero narrativo, reunidos não por usarem o mesmo código linguístico, mas por terem particularidades formais e temáticas semelhantes. Dois deles mundialmente conhecidos, o nicaraguense Rubén Darío e o argentino Jorge Luis Borges e um pertencente à literatura periférica, a do Espírito Santo, Luis Guilherme Santos Neves. Este último seleciona motivos de Borges e os (re)escreve. Porém, no entrecruzar das semelhanças e diferenças, apresenta-nos um texto original. A sua dívida aos dois escritores latino-americanos advém não da intenção de dependência cultural ou de um desejo de mutilação, mas de um diálogo declaradamente expresso com o argentino. Nele, via literariamente histórica, o horizonte periférico se estende até o escritor nicaraguense, impregnado de ideologia colonizadora. Com a técnica de reescrever Borges, o capixaba identifica-se, via Darío, com o universal. Dilacerando uma escritura, afirma a sua. Leia

 

Um romance mais do que histórico

Luiz Guilherme Santos Neves

Em 1860, alguns meses depois de D. Pedro II visitar o Espírito Santo, o fotógrafo francês Victor Frond, acompanhado do escritor e compatriota Alexandre Jouanet, repetiu grande parte do roteiro seguido pelo imperador. Seu objetivo era o de fotografar diferentes aspectos da terra capixaba para um projeto do governo imperial visando à publicação de um livro que, todavia, não se efetivou.

Mais de cento e cinquenta anos depois o historiador Cilmar Franceschetto lança a obra Victor Frond 1860 (*) em que rastreia as pegadas do francês na captação das que são consideradas as mais antigas fotos paisagísticas do Espírito Santo (dezesseis ao todo), datadas de meados do século XIX. Leia

 

Tavares Bastos: o embaixador da poesia brasileira na França

Anaximandro Amorim

Antonio Dias Tavares Bastos. Certamente, você nunca ouviu falar nesse nome. Sinceramente, nem eu, há algum tempo. Engolido pela poeira da História, deparei-me com o nome de Tavares Bastos, pela primeira vez, lendo o “Mapa da Literatura Brasileira produzida do Espírito Santo”, do escritor Reinaldo Santos Neves, publicado no site “Estação Capixaba”. Desde então, luto para fazer o nome de Bastos reluzir novamente. Leia

 

Do que eu falo quando falo sobre a escrita

Eduardo Madeira

Em diálogo com Ernesto Sábato, Borges afirma, referindo-se ao fato de que o Dom Quixote é muito mais do que uma sátira contra o romance de cavalaria, assim: “Se ao final, quando termina a obra, o autor pensa que fez o que tinha se proposto, a obra não vale nada”. A frase diz respeito ao processo de criação de um texto literário que, certamente, deve partir de um planejamento, um roteiro, uma pesquisa, mas seu autor também deve permitir que o processo em si o leve a caminhos nunca dantes navegados, que seu processo lance luz sobre o desconhecido, que ele surpreenda a si mesmo e que não se torne refém do próprio discurso. Leia

 

Revista Ímã

A revista Ímã, criada e editada por Sandra Medeiros, foi um marco das publicações periódicas no Espírito Santo. A revista, que alcançou cinco edições, teve seu primeiro número lançado em 1985 e, mesmo após mais de trinta anos de seu surgimento, continua sendo uma referência nas artes gráficas, figurando como uma das mais importantes publicações do Estado. Há alguns anos sua idealizadora conversou com o escritor Pedro J. Nunes a respeito de seu amor pelo livro e pela leitura e de suas atividades editoriais. E, claro, muito sobre a revista Ímã. Esta conversa é publicada aqui, na íntegra. Leia

 

Maria Stella de Novaes e a cultura capixaba

Fernando Achiamé

Iracema Moraes de Matos era minha tia-avó, e de fato avó social, pois criou três dos seus sobrinhos: meus tios Dicamor e Pedro, e minha mãe Felisbina (Bina), órfãos de pai e mãe desde bem pequenos. Vovó Iracema era casada com Arnulfo Matos e muito amiga de Maria Stella de Novaes, a quem chamava de Stellinha, e que a mencionou em seu livro A mulher na história do Espírito Santo. Ainda criança, conheci dona Stellinha no apartamento dos meus avós, no quarto andar do Edifício Presidente, no centro de Vitória. Logo me encantei com aquela pessoa diferente, que falava de modo distorcido e num tom alto, por ser surda. Com cabelos curtos, mais brancos que grisalhos, de porte empertigado e com voz firme, a figura de dona Stellinha nunca mais me fugiu da memória, devido também às constantes referências que a ela faziam meus familiares. Leia

 

Kitty e Reinaldo Santos Neves: divertimento

Francisco Grijó

Kitty tem 22 anos e, como toda garota de 22, vive para se divertir. Frequenta baladas, dá as caras em blogs e fotologs, seduz quem lhe passa por perto, dirige um Audi, comunica-se por gírias, é gostosíssima e debocha de tudo e de todos - não é assim que uma mulher se diverte? Claro que a expressão divertimento, a que o autor do romance se refere, relaciona-se à música: divertissement é gênero musical com trezentos anos nas costas e revela-se sempre alegre e despreocupado. Kitty é assim, pelo menos até certo ponto. Até perceber que o mundinho fútil em que vive - e do qual ela só não é peça descartável porque Reinaldo Santos Neves não deixa - desmoronaria com um espirro. Leia

 

Memória repartida, romance polifônico

Francisco Aurélio Ribeiro

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Um romance é uma criação literária narrativa de forma complexa, segundo conceituação de André Jolles, podendo ser constituído de variados discursos de formas simples - lendas, causos, chistes, cordéis -, o que o caracteriza como uma narrativa dialógica ou polifônica, conceito divulgado mundialmente em seu clássico e já quase secular Problemas da poética de Dostoiévski. Bakhtin conceitua o romance moderno como dialógico, pois é um tipo de texto em que diversas vozes sociais se presentificam e se entrecruzam, relativizando o poder de uma única voz condutora. Leia

 

A série Letras Capixabas: uma contextualização

Francisco Aurélio Ribeiro

Quero começar a contextualização da série Letras Capixabas pelas afirmações de Hallewell a respeito da situação do livro no Espírito Santo, neste século, para que melhor se vislumbre a situação de penúria e miséria editorial neste Estado até a criação da editora da Fundação Ceciliano Abel de Almeida-UFES, em novembro de 1978, cujos objetivos gerais eram “a redução do grande vazio editorial capixaba, publicando obras que venham enriquecer o patrimônio científico e cultural do Espírito Santo”. [2] Leia

 

Os mamíferos: biografia de uma geração

Pedro J. Nunes

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Samuel Johnson, cidadão inglês do século XVIII, e Lêdo Ivo, brasileiro que viveu entre os séculos XX e XXI, não se entenderiam a respeito de biografias. Enquanto aquele estabelecia que “ninguém pode escrever a vida de um homem a não ser que tenha comido, bebido e convivido com ele”, este, bem ao contrário, acreditava que “a maioria dos biógrafos empenha-se em explicar a obra a partir da vida, quando o correto é exatamente o contrário: trata-se de explicar a vida a partir da obra”. Verdade, verdade mesmo, é que nessa sopa há várias colheres, e não há quem se entenda sobre essa questão.

Do alto de sua bem constituída reputação literária, depois de publicar meia dúzia de títulos de ficção, é chegada a hora e a vez de Francisco Grijó se aventurar pela biografia, publicando esse aguardado livro Os Mamíferos: crônica biográfica de uma banda insular. Leia

 

Marginalidade doméstica

Francisco Grijó

Ninguém discute que o que diferencia a literatura da não-literatura é a linguagem - e é justamente ela, instrumento essencial, que, lato sensu, determina as estéticas, adequando-se a um determinado momento histórico ou refletindo-o, como um espelho verbal. Há alguns dias elegi como livro da semana o clássico 26 poetas hoje, organizado por Heloísa Buarque de Hollanda, livro considerado por muitos o resumo quase bíblico de uma geração chamada "marginal", cujos integrantes - muitos deles, ao menos - compõem o panorama "estabelecido" da poesia brasileira, encaixados que foram num modelo que enquadra e rotula tendências e comportamentos. Leia

 

Roberto Almada

Ester Abreu

Roberto Almada (1935-1994), professor, crítico literário, dramaturgo, contista, romancista e poeta, nos deixou, também, comentários jornalísticos. Alguns de seus livros continuam inéditos. Em 1985, ganhou o Prêmio “Geraldo Costa Alves” com a obra O País d’el Rey & a casa imaginária, publicada, no ano seguinte, em 1986, pela FCAA-UFES.

Almada era escritor, mas um bom leitor. Apreciava os escritores ingleses, franceses e os hispânicos. Leia

Outras leituras

A certos respeitos

Coluna de Luiz Guilherme Santos Neves, com contos e crônicas inéditos.

 

Escritos da tarde

Coluna de Ivan Borgo, com textos inéditos e crônicas publicadas em seus dois livros: Crônicas de Roberto Mazzini e Novas crônicas de Roberto Mazzini.

 

Almanaque íntimo

Coluna de Pedro J. Nunes, com textos inespecíficos inéditos ou já publicados esparsamente em jornais e revistas.

 

Leituras

Coluna de Caco Appel, com impressões de leituras de livros de escritores capixabas.

 

Fatos e coisas do Espírito Santo

Escritos afetivos sobre nossa geografia, história, cultura, turismo, tudo que sejam fatos e coisas do Espírito Santo.

 

Livros integrais inéditos e já publicados de autores capixabas.

 

Resenhas e podcasts do Clube de Leitura Leia Capixabas.

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